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domingo, 16 de março de 2014

AFAZERES


O sonido estridente do despertador do celular de minha mulher toca precisamente às cinco da manhã. Ela se apressa em levantar, imbuída das responsabilidades do dia, mas eu ainda tenho mais vinte minutos. Viro de lado e tento dormir mais um pouco. O peso da sonolência começa a levar minha mente para o mundo no qual tanto gosto de viajar e já estou quase nele quando o canto forte de um bem-te-vi me traz de volta para a clarividência desse dia que nasce. Só o canto dos pássaros é mais agradável que sonhar.
Ele canta de novo e eu percebo que está perto da janela do meu quarto, levanto apressado, mas, refletindo em sua fuga com a abertura das cortinas, contenho-me e me satisfaço com seus sons. É um canto simples, com pouquíssimas variações, mas rico de intensidade e mavioso encanto. Aproximo o ouvido da vidraça, quero ouvi-lo melhor, e ele canta mais umas quatro ou cinco vezes até silenciar sem ter uma companheira que lhe dê resposta.
Espero por alguns minutos até ter a certeza de que já se foi. Abro a janela, não o vejo. O seu trinado se faz ouvir mais uma vez, mas bem ao longe, já bem na saudade, quem sabe à janela de outro admirador de seus gorjeios.
Fecho a cortina sorridente e vou para os meus afazeres com a certeza de que esse será um ótimo dia.

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